A primeira pessoa realmente livre nasceu a alguns anos atrás, mas ninguém deu muita importância para ela.
O evento do nascimento era aguardado por todos ao redor do mundo. Muitas câmeras de alta resolução e repórteres carregados de equipamentos estavam presentes, sempre aguardando alguma imagem ou notícia, sobre aquele que seria o primeiro grande acontecimento em muitos anos desde que um cara resolveu jogar alguns aviões contra dois prédios tempos atrás.
O relógio já estava quase marcando meia noite. Os repórteres que se amontoavam em frente ao hospital aguardavam ansiosamente para serem os vetores da informação que acalmaria Dona Joana, que assistia em casa a tudo o que acontecia com grande aflição.
Dona Joana era uma dona de casa que vivia com seus 2 filhos adolescentes, Jô e Ana, isso mesmo, uma contração do nome Joana. Dona de casa padrão, Dona Joana era feliz com o que tinha, mas sempre sonhava em ter mais. Sonhava em comprar aquele conjunto de vasilhas plásticas que custavam o preço de um conjunto de vasilhas plásticas, só que contendo ouro dentro. O motivo do preço exorbitante do conjunto era apenas um; O vendedor.
O vendedor das tais vasilhas plásticas era Ecléscyo Cristiano, moço alto e de cabelos bem cortados que sempre aparecia na televisão vestido em um terno marrom e com um cavanhaque muito bem delineado, tão bem delineado era o cavanhaque, que parecia ter sido talhado por um cirurgião plástico.
Ecléscyo Cristiano, no auge dos seus 47 anos, era o galã das donas de casa. Dona Joana, por exemplo, deixava tudo o que estava fazendo só para dar uma olhada nas propagandas do tal vendedor, que para ela, era até mais importante do que as vasilhas Plásticas e muito mais importante do que o cara que jogou os aviões contra alguns prédios anos atrás.
Mas alguma coisa Ecléscyo Cristiano e Dona Joana tinham em comum; eles estavam aguardando o evento do ano. No dia em que a pessoa mais livre do mundo iria nascer, o programa de Ecléscyo Cristiano não passou, e assim como Dona Joana, ele estava com o rosto grudado em sua televisão, aguardando, torcendo, e com muitas esperanças.
As notícias diziam que a pessoa que estava para nascer seria um exemplo e uma inspiração de liberdade para todos. Seria a primeira pessoa a nascer com asas e com a capacidade de voar, leve como a liberdade que ninguém nunca sonhou em ter. Seria a chance de Dona Joana ver uma pessoa capaz de voar para longe dos problemas do mundo e recomeçar a vida; Seria a chance de Ecléscyo Cristiano ver uma pessoa capaz se subir mais alto do que ele jamais sonhou. Seria uma inspiração para ele e para todos.
O relógio marcou meia noite, meia noite e dez, meia noite e vinte, meia noite e meia. E então de repente um silêncio se fez na praça em frente ao hospital, todos os repórteres ficaram calados e perplexos. A pessoa mais livre do mundo tinha nascido, e ela estava lá, sendo segurada por uma enfermeira na sacada do hospital. Mas alguma coisa não estava correta, a criança só tinha uma asa, como poderia voar e servir de inspiração? Em poucos minutos a euforia teve fim, os carros e os repórteres rapidamente sumiram do hospital, Dona Maria desligou a televisão e foi dormir, Ecléscyo Cristiano fez a mesma coisa, só que antes de dormir resolver beber uma dose de whisky e chorar pensando na sua mal sucedia carreira de ator Global.
O fato foi abafado e nunca mais ninguém falou sobre o assunto.
Muita Gente não sabe, mas a pessoa mais livre do mundo se chama Ana Clara. A expectativa criada sobre o dia do seu nascimento acabou por torná-la infeliz e não realizada na vida.
“Não é minha culpa não ter nascido como os outros queriam”, É o que a psicóloga costuma trabalhar em clara, mas não tem adiantado muito, a decepção parece não abandonar as pessoas. Hoje clara tem 25 anos e trabalha de garçonete em uma lanchonete perto do metrô. Junto com ela trabalha também Pedrinho, que nasceu um mês depois de Clara.
Pedrinho era uma grande esperança, ele viria para salvar o casamento de seus pais que já vinham brigando e se desentendendo há muitos anos; Mas Pedrinho nasceu com um problema, ele nasceu com trissomia no cromossomo 21, a famosa Síndrome de Down, fato que acabou frustrando os planos dos seus pais que meses depois do seu nascimento se separaram. Pedrinho ficou com a mãe que até hoje o culpa do fim do seu casamento.
A expectativa criada sobre o dia do seu nascimento acabou por torná-lo infeliz e não realizado na vida.
“Não é minha culpa não ter nascido como os outros queriam” é o que clara costuma trabalhar em Pedrinho, mas não tem adiantado muito, a decepção parece não abandonar as pessoas.
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